Meu dia começa bem cedinho, logo às 6 horas já estou de pé. Vou pra natação, bem pertinho de casa; depois do exercício e do banho, começa a correria em direção a primeira escola em que trabalho; a EEEF Araguaia.
Pego meu carro, um KA-fofo, e entro na Av. Cavalhada. Invariavelmente estou atrasada, pois saio da natação às 7h30 e tenho 15 minutos para percorrer 11 km até o Araguaia. O movimento é intenso, pois tem muitas escolas nessa avenida. A Cavalhada se bifurca com a Eduardo Prado e lá vou eu... descendo a avenida com cuidado, pois tem dois pardais bem colocados por lá. Chego à rótula com a Av. Juca Batista, próximo ao Zaffari Ipanema, e sigo em direção à zona sul. Neste ponto o trânsito já não é tão intenso e dá pra dar uma pisada a mais – sempre com segurança – no acelerador. O local mais perigoso é na rótula de entrada do bairro Belém Novo; alguns metros adiante e mais uma rótula, com a estrada Gedeon Leite, dessa vez a que devo virar à esquerda. De longe já dá pra ver o movimento das crianças; nosso “guardinha” o seu Toledo, muito querido por todos, já está em seu posto, parando o trânsito para os alunos atravessarem a estrada. Quando estaciono no pátio da escola, alguns alunos já cercam o carro, ansiosos para serem os primeiros a dar o bom-dia para a professora, disputam o material que tenho de carregar, a garrafa de água que ponho na geladeira todas as manhãs... enfim, todos querendo me ajudar. Como trabalho com os anos iniciais na biblioteca e com a 5ª e 6ª séries em sala de aula, o tamanho dos alunos ao meu redor é sempre variado. Vou pra essa escola todos os dias e amo muito esse lugar. Apesar de concordar com alguns argumentos de quem diz que não devemos fazer do nosso local de trabalho um “segundo lar”, é assim que me sinto quando piso nela: entrando em casa. Temos uma direção excelente, que dá plena autonomia e poder de autoria ao seu grupo, não tem como não se sentir a vontade.
As quartas, quintas e sextas são dias de jornada dupla. Saio do Araguaia, às 11h55, e vou em direção à Restinga. Entro na Avenida do Trabalhador, Lomba do Pinheiro e entro em São Tomé, já município de Viamão. Vou até a RS 118 e sigo em direção à Gravataí. Passo pelo autódromo de Tarumã, pelo distrito industrial de Alvorada, cruzo o rio Gravataí e chego ao distrito industrial dessa cidade. Estou no Morro do Coco, bairro Bela Vista, um dos pontos mais altos e perigosos de Gravataí. O cenário é mais triste, muita pobreza, muita criança de pé no chão brincando com o esgoto a céu aberto. Minha escola, a EMEF José Mariano Garcia Mota, fica numa “quebrada” desse morro. É o segundo ano que leciono lá, no começo foi bem difícil. Tenho turmas que é o sonho de qualquer professor do Estado, a maior tem 16 alunos! Mas é uma “clientela” (nome horroroso) bem complicada, com uma realidade bem diversa do que já tinha encontrado, com costumes próprios e linguagem própria. Cheguei para desequilibrar o ambiente e dei aos meus alunos, primeiramente muito, muito afeto... depois fui me preocupar com o resto. Tanto que o “conteúdo” que trabalho com a 6ª série na outra escola, só consigo “dar” no final da sétima aqui, e com dificuldade! Mas a minha preocupação maior, como professora de língua portuguesa é fazê-los perder o medo da escrita e recuperar suas autonomias que muitas vezes nós mesmas, professoras, sonegamos.